Frágil

29 setembro, 2010
Nenhum comentário

A menina tocou com a ponta do dedo a maria-dormideira, que se enroscou todinha em si mais uma vez. Gostava daquela plantinha estranha que se mexia, desde criança se acostumara a reconhecer e a brincar de observar seu movimento. Mas, naquele momento, há anos de distância da meninice colorida, ela percebia-se tristemente semelhante àquela débil criatura... tão frágil também e tão habituada a retrair-se à vista do que considerava perigo!

Viu algumas outras que tocara segundos antes já se abrindo novamente, valentes e tratou de fazê-las fecharem denovo. Pensou meio humilhada consigo mesma: "Até plantas são mais corajosas que eu...".

Desapego

27 setembro, 2010

Estávamos olhando as estrelas, ou melhor, alguma estrela que vez por outra aparecia entre as nuvens. O céu estava nublado e parecendo assustadoramente mais próximo, mas nem por isso menos bonito. Aquela sensação boa e sinistra de estar olhando para o infinito se completava com o farfalhar das árvores e com o escuro da varanda. Ventava.

Acho que falávamos de pessoas, de amor, como se conversássemos com nós mesmos na verdade. Às vezes acho estranha a sintonia que nós temos, como numa amizade tão profunda que até pensamentos são compartilhados. Não estávamos felizes, talvez um pouco angustiados pela lua encoberta e o vinho não me fizera bem.

Pois é, existem pessoas que só fingem que amam porque precisam sustentar uma bandeira, uma aparência... Ele disse essas palavras com uma calma suspirosa, como se alguma tristeza estivesse escondida no tom tranquilo.

Você não me ama? A pergunta saiu sozinha da minha boca, sem mágoa, sem perspectivas. Por um instante, fiquei surpresa com minha própria sinceridade e coragem. Percebi que não tinha medo da resposta, que, por mais que eu soubesse o quanto minha vida seria vazia sem ele, eu aceitaria se a resposta fosse ‘Pra falar a verdade, não...’. Não entendi direito o que se passava, uma estranha sensação de desapego.

Não sei se foi de propósito, mas ele ficou em silêncio um pouco, com olhos vazios para o céu. Eu fiquei olhando sua expressão meio lívida, pra ver a resposta saindo da boca.

Amo, sim. - Ele disse expontâneamente, mas com convicção.

Hum...

Fugida

20 setembro, 2010
Vou-me embora pra Pasárgada

Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
(Manuel Bandeira)

Estava decidido, como se decide coisa importante: depois de pensar muito, depois de pesar as consequências e testar a saudade.

Ela ia mesmo embora, fugida. Do pior jeito, é verdade, mas, fazer o que? Se explicasse ninguém ia dar crédito, capaz até que tentassem prendê-la ou internar no hospício de Barbacena. Não! A dor ia ser maior, sabia. Talvez a procurassem pro resto da vida, talvez alguém entrasse em desespero ou apelasse pro programa do Ratinho. Dava até uma pontinha de tristeza pensar no papai, nos avós e no gato que logo ganhariam a alcunha 'abandonados'. Mas, pela primeira vez, reunindo toda a coragem que guardara pro momento, ela resolveu ser egoísta, pensar conforme sempre se gabava fazer: seguindo o coração.

Saiu de fininho, num domingo branco feito pra ela. Deixou um papelzinho 'imado' na geladeira:
"Fui me encontrar. Desculpe! Não dava mais pra viver sem mim...
Obs: Cuida do meu gato."


Acho que ficou meio cômico, mas devo dizer que o que me motivou a fazer esse texto não tem muita graça... Enfim, já estava me afastando daqui denovo, mas não quero que isso aconteça. Amo muito esse mundinho paralelo à minha realidade tosca e cinzenta... Só pra constar, adoro vocês que comentam aí com carinho.

A Vida É Dura

12 setembro, 2010


–E se eu não quiser mais andar entre os espinhos? E se eu viver para observar a paisagem e fotografar o pôr-do-sol?

–Isso não seria justo, afinal a vida é dura...

–Eu poderia sentir o cheiro de hortelã, erva-doce e colher girassóis... Guardaria apenas isso, além das fotografias.

–Isso não é importante, que tolice!

–Mas, eu não quero mais ferir meus pés...

–Esta não é uma opção, sinto muito.

–Olha, eu não consigo.

–Você precisa.

–Por que?

–Porque a vida é dura.

–Quem lhe disse?

–Isso também não é importante...

Olhem Os Passarinhos!

10 setembro, 2010

O sol brilhava com força, mas uma brisa fresquinha vinha tornar a caminhada em torno do rio tão amena... Muitas pessoas apressadas passavam, algumas esperavam seus ônibus, impacientes, outras conversavam empoleiradas no parapeito à sombra da decaída vegetação ciliar.

Mas, havia alguém com um olhar diferente, de cotovelo apoiado na grade e olhar concentrado. Observava o tapete verde que se estendia em algumas partes do rio sujo, parecia impaciente.

De repente, uma movimentação salpicante e uma revoada de pequenos passarinhos coloridos surgia por entre as folhinhas, voando baixo e com graça e depois sumindo noutra nuvem de vegetação flutuante.

“Olha!”, a garota gritou pra ninguém, sem pensar entre pulinhos e risos. Parecia certo que alguém mais estaria ali deslumbrado como ela, foi até meio decepcionante quando constatou que ninguém compartilhava do momento. Desapontada, fez um bico xoxo de vergonha e tornou a observar quieta.

Cinco segundos depois, outro movimento rápido e os pequenos bichinhos surgiam de novo e desapareciam. “Olha!” E mais risos e mais pulinhos.

Preciso dizer que sou eu? É a minha cara pagar 'miquinhos' desse tipo. Fazer o que se a natureza me hipnotiza? Ainda mais pássarinhos fofos, vocês precisavam ver que gracinhas!
Fico feliz e admirada de ainda existir vida no rio Muriaé, tão sujo e fedorento... Acho que se as pessoas prestassem mais atenção a essas pequenas coisas bonitas que acontecem no dia-a-dia, talvez a vida fosse menos dura, quem sabe?

A Antropóloga

07 setembro, 2010
Há uma crença
popular entre os antropólogos que diz
que você deve mergulhar em um mundo
desconhecido a fim de compreender
verdadeiramente o seu próprio.
(O Diário de Uma Babá)


Observar sempre foi um hábito meu, como boa antissocial que tem preguiça de conversar (pelo menos é o que sempre disseram de minha pessoa), até acho divertido analizar quem passa por mim, imaginar seus mundos. Por muitas vezes me pego imaginado como eu seria se tivesse a vida de Sicrano ou quais seriam minhas ideias se eu fosse Fulano.

Isso me levou a outro (bom) hábito, o de sempre ponderar sobre as atitudes das pessoas, que são muito mais difíceis de serem compreendidas apenas do alto de minha própria realidade. Essa reflexão me leva a crer muito menos em bons e maus e muito mais nas circunstâncias que regem todas as existências. Também consigo valorizar mais meu próprio mundo, que, bem ou mal, é feito de minhas próprias escolhas e, diferente de todos os mundos à minha volta, penso que me convém mais que qualquer outro.

Semestre passado, eu tinha aulas de antropologia (Estudo do homem) na faculdade. Confesso que eu não gostava muito do professor, mas achava maravilhosas as coisas que ele dizia, tudo muito lógico para mim -amo a lógica!- e esclarecedor. Na verdade, eu escrevi esse texto porque vi um filme que me despertou esse conceitos. O Nome é 'Diário de Uma Babá'. Eu também não dava nada pelo título, mas gostei muito, me identifiquei com as ideias da personagem. *Se não fossem aqueles traillers que passam antes dos filmes, não sei o que seria de mim, rs!

1, 2, 3, Vamos Limpar...

01 setembro, 2010


Hoje estava observando meu coração. Sempre tive um sério problema com organização, por isso as coisas por lá não andavam nada arrumadinhas. O embaraço era tanto que os sentimentos se atrapalhavam e se confundiam. Foi aí que uma ideiazinha meio maluca surgiu... Sempre amei caixinhas, são ótimas pra arranjar bugigangas... Porque não para organizar toda aquela tranqueira? Levei um punhado pro meu coração!

Na maior que tinha, escrevi 'passado' e lá coloquei quase tudo que estava pelo chão. Ao contrário do que sempre pensei, não houve necessidade de trancá-la com uma chave e jogar fora, pois muito ali poderia servir denovo. Além do mais, tinha tanta coisa bonita!

Em outra caixinha, escrevi 'sonhos' e foi um pouco difícil separar o que pertencia à 'perspectivas' e à 'planos concretos', mas me esforcei muito pra não sofrer tanto nessa tarefa.

Não me dei ao trabalho de deixar uma para 'decepções' e para 'derrotas', achei que esses poderiam ficar na ‘passado’ mesmo. Alguns, com muita alegria, coloquei na 'superados', a mais colorida de todas e minha preferida.

Fiquei em dúvida se deixaria alguma para ‘culpa’, mas tinha uma caixinha tão pequena e sem-graça que não encontrei outra utilidade... De tão feinha, achei melhor esconde-la entre as outras.

Pronto! Estava quase limpinho... Levei até um susto com o tamanho do espaço que ganhei. Alguns entulhos ainda estavam jogados porque eu não soube direito onde colocar. Resolvi que depois eu voltaria pra transformá-los em lágrimas, numa história ou talvez em gritos na montanha russa... Hoje, lembrando, percebi que esses se encaixariam muito bem numa que se chamasse ‘tempo’. Se eu não fosse tão distraída...

Não queria que ficasse grande -sei que a preguiça é muita- mas saiu assim, fazer o que? Queria mandar um grande abraço às pessoas carinhosas que lêem e comentam aqui. Amo muito ler os blogs que aparecem ali do lado, de verdade. Me sinto muito feliz em saber aproveitar essa troca de experiências tão legal que é ser blogueira. No fim, é isso que fica, sabiam?