Livre pra Sonhar

03 dezembro, 2009


Ela não estava enjoada dos pais, nem do convívio familiar. Não se tratava de rebeldia, nem de desagrado. Era simplesmente o destino. A vida a empurrara porta a fora, fez com que seu quarto cor-de-rosa ficasse pequeno demais para seus sonhos de mulher.

“401”, mostrava o rabisco mal feito na porta branca diante de Hilda. O lugar não a inspirava muito, era estranho... Sentiu um ímpeto de voltar e deixar pra mais tarde. “Você não precisa fazer isso”, se lembrou do que disseram seus pais. Mas, algo mais forte que o receio fez a chave ser colocada na fechadura e girada. Entrou. As malas com toda a sua ‘tralha’ e um colchão foram colocados dentro, ela pisou forçadamente com o pé direito primeiro. “Pra dar sorte”, pensou.

Viu um mundo vazio à sua volta, como uma folha em branco esperando para ser escrita. O desamparo foi o primeiro sentimento... Imediatamente ela sentiu saudade de sua casa, provou do gosto gélido da solidão, teve medo.

Alguma lágrima tentou cair, mas a sua velha e amiga esperança tratou de ampará-la. Com algum esforço, os sonhos guardados começaram timidamente a ganhar forma e logo corriam loucamente pelo cubículo. A imaginação tratou de fazê-la ver quadros nas paredes, uma mobília num canto e até cortinas floridas na única e pequenina janela do aposento. Hilda viu-se cercada por todos os seus desejos e planos, que finalmente puderam mostrar-se a seu coração. Ela quase pode tocar a liberdade, sentiu que era livre, como sempre quisera. Livre pra sonhar! Não pode evitar sorrir pra si mesma. Um misto de emoções (algumas estranhas) invadiu seu peito...

Quis gritar - e gritou. Quis pular - e pulou. O colchão cor-de-rosa era o melhor pula-pula do mundo! Uma música estranha ecoou na sua mente - e ela cantou: “Livre! Livre! Livre! IN-DE-PEN-DEN-TE!”

Alguém bateu na porta: O vizinho debaixo tinha um bebê.